quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Ensaio sobre a cegueira


Brasileiros conquistaram medalha de ouro no futebol de cinco, categoria deficientes visuais, nas paraolimíadas. Tá vendo, Dunga?


Por que foi que cegamos, Não sei, talvez um dia se chegue a
conhecer a razão, Queres que te diga o que penso, Diz, Penso que não cegamos, penso que estamos cegos, Cegos que vêem, Cegos que, vendo, não vêem.
(Ensaio sobre a cegueira. SARAMAGO, 1995, p.310)


O Brasil encerrou sua participação nas Paraolimípiadas com recorde de medalhas. Inclusive ganhou medalha de ouro no futebol de cinco para deficientes visuais.

Aí, provavelmente você pára e pensa: Poxa, os caras são cegos, tem uma porrada de limitações, sofrem vários tipos de preconceito diariamente e o mundo que "enxerga" custa a entender que é preciso adaptar o ambiente para que eles consigam viver sem maiores dificuldades. E vão lá, jogam e ganham. E a gente sabe bem o que é isso. É RAÇA. É o que os jogadores dotados de todos os seus sentidos e sem limitações físicas, não possuem.

Nossos jogadores ditos normais, são deficientes. São deficientes de raça. Quem vê, pensa que tudo que eles têm, caiu do céu. Mas, a maioria ali, assim como aqueles que conquistaram medalha nas paraolimíadas, tiveram muitas dificuldades (e ainda as têm). Falta de dinheiro, oportunidade, preconceito. No fim, nossos jogadores que "tudo vêem" conquistaram seu espaço. Ganharam dinheiro, mas deixaram pra trás a garra que eles tinham para chegar onde chegaram. Ficaram cegos pelo dinheiro, com o perdão do trocadilho.

Os nossos deficientes visuais ganharam uma medalha de ouro no futebol. Provaram que são capazes e tem "visão de jogo" muito mais do que jogador que enxerga. Mas os louros não lhe serão entregues. O trabalho bem feito ganha nota no jornal, mas não existe incentivo de verdade. Todos ali vão voltar pra casa com suas medalhas e vão continuar enfrentando os mesmos problemas de sempre. Afinal de contas, os patrocinadores só enxergam o lucro que vem de nossa seleção de futebol "normal", que tem um técnico que precisa de óculos e os jogadores idem.

Seria bom que esta medalha de ouro das paraolimpíadas servisse de exemplo para nossos diletos jogadores. Que eles entendessem que é preciso sempre provar que eles não estão ali à passeio. Que eles tem um dever a cumprir, e este dever deve ser bem feito. Mas como Saramago disse, existem cegos que vêem.

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